Sunday, February 19, 2006

Apuntes


Estudo de campo + nouvelle vague = educação sentimental.
(mas educação não garante mais mobilidade social ou amorosa. Alguns tapas na angústia, a fé no diagnóstico.)

***
Godard - Masculino, feminino (1966)

Nós muitas vezes vamos ao cinema. Tiritávamos enquanto a tela se iluminava. Muitas vezes, Madeleine e eu ficávamos decepcionados. Nós éramos decepcionados freqüentemente. As imagens cintilavam. Marilyn parecia terrivelmente velha. Não era o filme que tínhamos sonhado, o filme total que todos carregamos dentro, o filme que queríamos fazer... e quisemos secretamente viver.

***

Caminho sobre um grande divã. Faz cachorrão, por favor, faz o cachorrão... Cheiros, olores, mamilos. Eu, sentada no seu colo. Um homem ria ao mesmo tempo que eu no cinema. Nós riríamos, pai. É a minha busca.

***

Transacional não quer dizer, necessariamente, superficial.

***

Eu pedi a nossa sobremesa: torta de maçã com sorvete de creme. Eu sempre me irrito quando não te encontro. E isso me faz pensar que eu ainda casaria com você.
Corta
E também lembrei, dessa vez de você, mocinho: no supermercado, tocou "Here, There and Everywhere". Um dia deixa eu ir escutar Beatles, ao sol, no seu quintal?


***

"Você revira na cama e me abraça forte pensando em outra. Em todas. Em uma mulher sem rosto que é todas e nenhuma."


Lealdade
Caetano Veloso - Victor Almeida

Serei
serei leal contigo
Quando eu cansar dos teus beijos te digo
E tu também liberdade terás
Pra quando quiseres, bater a porta sem olhar para trás
Se o teu corpo cansar dos meus braços
Se o teu ouvido cansar da minha voz
Quando os teus olhos cansarem dos meus olhos
Nao é preciso haver falsidade entre nós

Wednesday, February 15, 2006

paralelismos

+++

PEQUENO, MIUDO, QUASE NADA

Dos quadris estreitos vem a dor do que não é.
Olha o sangue...
Não é escarlate: marrom, da cor do tempo.

Detesto tanto e mais o que o meu corpo deseja, os artigos definidos,
os possessivos. Detesto tanto e mais o que minha língua traz em gosto
e palavra, e o que o ouvido guarda.

Eu escuto bem o que está escrito, que ressoa, ressoa. (O que vai na
mente é voz, cheiro, dor ou idéia? Ou é apenas cor, objeto e letra
após letras após letra?)

Se eu olhar com bastante atenção no espelho embaçado, enxergo as
punhaladas no ventre - tão reais. Estímulo visual: assim surge o
mundo. E a temperatura. O corpo de menina - que diz, mudo, apenas Não.

Leia o que dizem meus quadris, meus ossos-fortaleza (estalam quando em
perigo). Há palavras brotando de todos os poros, cavidades, de todos
os buracos do meu corpo. Junte as mãos em concha, por favor, recolha
algumas.

Hoje eu mordi uma fruta muito úmida, deixei o sumo, amarelo
transparente, me escorrer pelo queixo, pescoço, colo.
Hoje, como ainda sempre, a vida vazou de mim.

(ligia diniz)

Tuesday, February 14, 2006

Eles

não se esqueça que você já me esqueceu
O Poema das Sete Faces, duplificado. A rima que não deu, nunca vai dar. O cabelo fininho. Poderíamos ser irmãos, sabia?
Nós três irmãos, gauches. Às vezes, depois de muito champanhe ou quando substituo o f pelo h, eu lembro de você, lambe olhos, torce cabelos (meus milhares de fios capilares) e eu ainda me lembro de você.
Eu não quero mesmo voltar. Quem vai me comprar? Aceito ofertas. A verdade é que eu aceito comida, você tem razão.
Quando ela entrou, eu olhava para o letreiro de Jesus, piscante. Não, eu olhava para o chão. E ela me pareceu um anjo, de porcelana, desembalada há pouco dos algodões e do papel celofane. As asas de lantejoula nos pés.
Eu não quero mesmo voltar.

Monday, February 13, 2006

Acabou

Acabou o folhetim. Sem páginas, cem páginas. E eu hoje ouvi Rita Lee, en castellano. Y Gershwin.

Mania de ti - Rita Lee

Vivir tu amor me da agua en la boca
Vistiendo fantasías más todo sin ropa
Mojada de sudor
De tantos besos sin final
De tanto imaginar locuras

Hacemos el amor por telepatía
Aquí en el mar, la luna en la melodia
Manía de tí
De tantos besos sin final
De tanto imaginar locuras

Nada mejor hay que nunca hacer nada
Más que soñar y gozar junto a tí


How long has this been going on ?
Gerswhin

As a tot, when I trotted in little velvet panties,
I was kissed by my sisters, my cousins, and my anties.
Sad to tell, it was hell, an inferno worse than Dante's.
So my dear I swore,
"Never, never more !"
On my list, I insisted that kissing must be crossed out.
Now, I find I was blind, and oh my ! , how I lost out !

I could cry salty tears ;
Where have I been all these years ?
Little wow, tell me now :
How long has this been going on ?

There were chills up my spine,
And some thrills I can't define.
Listen, sweet, I repeat :
how long has this been going on ?

Oh, I feel that I could melt ;
Into Heaven I'm hurled !
I know how Clombus felt,
Finding another world.

Kiss me once, then once more.
What a dunce I was before.
What a break ! For Heaven's sake !
How long has this been going on ?

Dear, when in your arms I creep,
That divine rendez-vous,
Don't wake me, if I'm asleep,
Let me dream that it's true !

Kiss me twice, then once more.
That makes thrice, let's make it four !
What a break ! For Heaven's sake !
How long has this been going on ?
--How long has this... been going ... on

Tuesday, February 07, 2006

187

A vida faz muito calor.
E tem fumaça (e eu queria a esquadrilha).
187 vezes 2.
E Maria Bethania, um amor.
Oh, abelha rainha.
(você, o Ricardinho, ela).
Mais fumaça.
Pode tocar Maria Bethania impunemente na comédia romântica independente (agora, o Ricardo) da tv argentina?
Pode não, faça isso não.

Saturday, February 04, 2006

A terceira margem do rio (do Prata)

(Caetano Veloso/Milton Nascimento)


Oco de pau que diz:
Eu sou madeira, beira
Boa, dá vau, triztriz
Risca certeira
Meio a meio o rio ri
Silencioso, sério
Nosso pai não diz, diz:
Risca terceira

Água da palavra
Água calada, pura
Água da palavra
Água de rosa dura
Proa da palavra
Duro silêncio, nosso pai

Margem da palavra
Entre as escuras duas
Margens da palavra
Clareira, luz madura
Rosa da palavra
Puro silêncio, nosso pai

Meio a meio o rio ri
Por entre as árvores da vida
O rio riu, ri
Por sob a risca da canoa
O rio riu, ri
O que ninguém jamais olvida
Ouvi, ouvi, ouvi
A voz das águas

Asa da palavra
Asa parada agora
Casa da palavra
Onde o silêncio mora
Brasa da palavra
A hora clara, nosso pai

Hora da palavra
Quando não se diz nada
Fora da palavra
Quando mais dentro aflora
Tora da palavra
Rio, pau enorme, nosso pai

***
E:

Esse Cara
(Caetano Veloso)

Ah! Que esse cara tem me consumido
A mim e a tudo que eu quis
Com seus olhinhos infantis
Como os olhos de um bandido
Ele está na minha vida porque quer
Eu estou pra o que der e vier
Ele chega ao anoitecer
Quando vem a madrugada ele some
Ele é quem quer, ele é o homem
Eu sou apenas uma mulher

***

Pois muito bem:

Suas Mãos
(Pernambuco / Antônio Maria)

Ah, suas mãos onde estão
Onde está o seu carinho
Onde está você

Ah, se eu pudesse buscar
Se eu soubesse onde encontrar
Seu amor, você

Um dia há de chegar
Quando ainda não sei
Você vai procurar
Onde eu estiver
Sem amor, sem você

Ah, suas mãos onde estão
Onde está o seu carinho
Onde está você

***

A você, mon ami, :
bater a máquinas com dois dedos e amar com a vida inteira.